Visitei recentemente dois projetos diferentes para um mesmo programa: uma residência unifamiliar com galeria de exposição para um colecionador de arte. A primeira foi a Maison Louis Carré, do finlandês Alvar Aalto, que fica em Bazoches-sur-Guyonne, nos arredores de Paris, e a segunda foi a Maison La Roche, de Le Corbusier, que fica no 16º arrondissement parisiense. Embora lidem com a mesma temática, podemos dizer que trabalham a partir de partidos e contextos opostos.
A Maison Louis Carré é o único projeto de Aalto na França. Aparentemente, o colecionador Louis Carré era um amigo de Corbusier. Ele chegou até a morar 7 anos em um dos seus prédios. Depois disso disse: “chega! Concreto demais!” (Trop de betón!!). Recorreu então a Aalto para fazer a sua casa em uma região rural a aproximadamente uma hora de Paris.
A casa está pousada sobre um terreno inclinado. Seus espaços estão distribuídos horizontalmente, adequando-se ao declive natural do solo. A inclinação da cobertura estabelece uma semelhança com o perfil do terreno num gesto muito elegante. Os traços geométricos do projeto adquirem uma maior suavidade e leveza graças a essa estreita relação com o contexto.
O tijolo em relevo na fachada é proposital. Revela a construção e o processo, além de atribuir uma textura à parede.
Um dos pedidos de Louis Carré foi que a casa deveria ser pequena de fora mas grande por dentro. Temos uma noção clara disso no momento em que adentramos o hall. Sob a cobertura plana, Aalto criou uma sala com teto curvado. A sensação de amplitude é enaltecida pelas entradas de luz. Com isso, o adentrar da casa torna-se uma espécie de ritual. Neste gesto, há uma relação direta com alguns dos seus projetos de igrejas. A própria luminária do hall, por exemplo, havia sido desenhada por ele antes para a igreja “three Crosses” em Lahti, na Finlândia.
Visto que a fachada norte não recebe luz alguma durante o dia, a janela da sala de jantar rompe o alinhamento dessa fachada, avançando rumo ao noroeste. Assim, ela captura a luz do entardecer, rebatendo-a na parede e redirecionando-a para a sala. Um gesto sutil que demonstra como o pensamento de Aalto está presente em todos os pormenores.
Já a Maison La Roche, de Le Corbusier, inserida na trama de urbana de Paris, parece mais um refúgio da cidade, negando o seu contexto. Um projeto interiorizado, cujos espaços se organizam todos em torno do hall central.
A planta baixa é organizada em dois núcleos distintos – um com os espaços de moradia e o outro com os espaços de trabalho, respeitando a filosofia de Corbusier de setorização por funções. Ambos os núcleos são acessados pelo nível de térreo embora possuam uma ligação direta um com o outro no primeiro andar, através de uma circulação semiaberta. O segundo andar já oferece um isolamento para ambos os segmentos. Para passar de um para o outro, é necessário descer novamente as escadas e cruzar pela passarela que atravessa o hall central.
Mas apesar dessa separação, há uma constante relação visual entre os dois lados, preservada em todos os níveis graças ao vazio do hall.
Se formos comparar a Maison La Roche(1923) à Villa Savoye(1928-31), diríamos que a Villa Savoye é completamente didática. Nela, os 5 princípios do modernismo, elaborados por Le Corbusier – o pilotis, a janela em fita, o terraço jardim, a planta livre e a fachada livre – estão mais claros e eloquentes. Na Maison La Roche, estes princípios, ainda em formação, são menos óbvios. Com isso, o percurso e o olhar do visitante são mais livres, menos enquadrados. Os direcionamentos não vão além de sugestões, sobretudo através das entradas de luz. Em especial, achei o jogo de luz na casa simplesmente sublime.
A Villa Savoye também já foi assunto do blog no texto: Villa Savoye